P&N – Empresas familiares: a beleza dos véus da longevidade

Nós somos o tecido de que são feitos os sonhos!” William Shakespeare

Um tema, sem dúvida, emocionante! Se pararmos para pensar, refletir:

– Todos somos netos, todos somos filhos, muitos somos pais e alguns somos avós;

– A grande maioria das famílias brasileiras teve, tem ou terá algum tipo de negócio, formal ou informal, grande ou pequeno;

– Empreendedorismo é um dos traços culturais mais marcantes dos brasileiros;

– Ao olharmos com profundidade para nossos antepassados, poderemos nos surpreender com a quantidade e a qualidade das experiências reais de empreendedorismo;

– Nossa formação cultural é riquíssima: diversidade, mistura étnica, geografia, clima, localização no globo terrestre, novo mundo, realidade multifacetada…, tudo isso impulsionando o risco, a inventividade, o desapego às tradições, à “desestruturação”;

– Somos, por natureza, rebeldes, indisciplinados, avessos à hierarquia, apesar de muitas vezes nos submetermos, com indignação contida e velada.  Uma força de resistência ao instituído, entretanto, sabendo que tudo tem “os dois lados da força”;

Somos, na maioria, empresas familiares, vivendo esta experiência direta ou indiretamente!

De acordo com o BNDES, 90% das empresas privadas no Brasil são de natureza familiar. Importantes geradoras de empregos e fontes consideráveis de arrecadação de tributos, estas empresas são fundamentais em economias industrializadas e emergentes.

E como nasce uma empresa familiar? Geralmente, de um sonho!  Sonho tecido por pioneirismo, força, coragem, e muita emoção!

Sensibilidade, habilidade, competência e conhecimento dos meandros da cultura organizacional são essenciais para se trabalhar e/ou gerir empresas familiares, seja nas de primeira geração, onde as decisões estão centralizadas no fundador, seja naquelas ainda mais complexas, onde o controle já está pulverizado entre os herdeiros e os executivos de mercado. Segundo a pesquisa global Next Generation, da PwC, publicada em 2014, apenas 12% das empresas familiares chegam à terceira geração.

Os herdeiros, muitas vezes, não têm a mesma visão do fundador e, além disso, muitos deles não se preparam para assumir a gestão da empresa. Dos entrevistados da nova geração, 59% consideram, como maior desafio, a conquista do respeito dos colegas de trabalho. Importante, também, avaliar outros aspectos que impactam a credibilidade dos sucessores.

Empresas familiares têm se tornado um mercado atraente para executivos externos. Entretanto, os executivos de multinacionais ou de empresas de capital aberto têm tido dificuldade para obter sucesso na gestão de empresas familiares, por buscarem resultados de curto prazo, que garantam os expressivos bônus pagos pelas multinacionais. Diferentemente do que acontece nestas, a perspectiva da empresa familiar não se restringe a cinco ou dez anos; ela vislumbra duas ou três gerações seguintes. Desta forma, para conseguir contratar um experiente executivo externo, as empresas familiares muitas vezes se submetem à padronização e rigidez dos sistemas salariais de mercado. E isto pode comprometer, no longo prazo, os resultados não só financeiros como também os sociais, se, a princípio, não houver um alinhamento de propósitos entre os executivos escolhidos e as empresas.

Sendo assim, quando refletimos sobre a longevidade das organizações, independentemente de sua natureza, tamanho ou segmento de atuação, sabemos que o processo sucessório trará consequências que impactarão diretamente seu resultado e sua perenidade. Além disso, o sucessor imprimirá personalidade própria à empresa, podendo torná-la flexível ou rígida, apoiadora ou hostil, inovadora ou conservadora, sustentável ou não.

Nesse contexto, o principal desafio para a longevidade das empresas familiares, normalmente avessas a sócios e executivos externos, ainda é a transição de poder e sua profissionalização, que devem ser tratadas como um processo, não como um evento. A estratégia de longevidade está ligada, na essência, à expressão do “coração” da marca criada pelo pioneiro, preservando-se os dons e talentos, seja na produção dos bens, seja da prestação dos serviços, na arte do bem servir.

Para levar uma empresa familiar ao sucesso, o executivo ─ seja ele membro da família ou não ─ precisa, além de saber manter o equilíbrio entre razão e emoção, saber gerir o conhecimento; criar um ambiente de confiança e motivação; desdobrar a estratégia em metas e indicadores de desempenho em todos os níveis hierárquicos; valorizar a meritocracia na distribuição das recompensas; e, principalmente, ter liberdade de ação, fundamentada em princípios, valores e propósitos: exercer uma liderança efetivamente contemporânea!

Portanto, é imprescindível uma nova dimensão de liderança para a gestão das empresas familiares, porque, no fundo, sabemos que as experiências e desafios mais incríveis estão no nosso círculo mais próximo, no nosso núcleo familiar, e é daí que retiramos os insumos e os levamos para o mundo do trabalho e dos negócios.

Somos todos, na essência, “plantadores”, “semeadores”, “agricultores”, “cultivadores”, “sustentadores”; donos de lojas, mercados, padarias; fazemos alimentação, entretenimento…; enfim, produzimos e servimos; fazemos negócios! Cabe a nós, pois, a missão de estudar, praticar e reinventar as relações que nos afetam, trazendo à luz da consciência a beleza dos aprendizados, em nossa trajetória de vida e trabalho!

Rugenia Pomi
CEO Sextante Brasil